"Terei toda a aparência de quem falhou, e só eu saberei se foi a falha necessária." C. Linspector

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

A roda não pára

Em vão você corre. Em vão você se equilibra nas bordas dos copos. De esquina em esquina. De bar em bar. De cama em cama. As sandálias de couro batendo nas calçadas percorrem caminhos já conhecidos, seguros e finitos. Segue assim, se equilibrando no partido alto com medo dos jardins do samba canção. Mas ainda traz entre miúdos a calça listrada montada de chapéu em seus olhos prometendo "Manda que eu faço chover...". Pesarosamente,  dessa época o amor não convinha. Hoje parece que você e o dito cujo não falam a mesma  língua. Vez ou outra, na mesa no meio da roda, se materializa uma rosa, um livro do poetinha ou, como outro dia mesmo, uma fita de pulso. De longe não olha, não toca. Todavia as letras, odores e sabores saltam da mesa e brincam aos seus pés até onde lhe escapa, na saia godê e na ponta dos dedos, e em um lampejo, na sua língua. E você recorda do gosto, não lembra seu nome ou de onde veio, mas já o tem em seus pulmões. O samba pesa diferente em conjunto com o nó em sua garganta, mas a roda não percebe, e mantém o ritmo, e mantém os olhares em você. E como a vida não parou, e como você tem medo... Fecha os olhos e continua a sambar, bate o pé no chão e não se deixa levar.

Ai, quem dera o seu coração entrasse no compasso do samba, carioca ou do recôncavo, fazendo a roda girar sem medo, até o sol raiar.